Esqueça os monstros e os corredores assombrados. Em “A Vida de Chuck”, que estreou nesta quinta-feira (4) nos cinemas brasileiros, o diretor Mike Flanagan, mestre do terror moderno, adapta Stephen King para explorar um território diferente e surpreendente: o otimismo diante da mortalidade. O resultado é um drama existencial sensível, visualmente poético e com forte potencial para o Oscar.
O filme chega com o prestígio de ter vencido o Prêmio do Público no Festival de Toronto, um dos principais termômetros da temporada de premiações, e prova que as histórias mais impactantes de King nem sempre são as mais assustadoras.
A Vida Contada ao Contrário
Baseado no conto do livro “Com Sangue”, o filme narra a vida de Charles “Chuck” Krantz (Tom Hiddleston) de uma maneira singular: em ordem cronológica inversa. A trama é dividida em três atos que funcionam como peças de um quebra-cabeça.
O filme começa em um presente quase apocalíptico, onde anúncios enigmáticos celebrando os “39 ótimos anos de Chuck” intrigam um professor (Chiwetel Ejiofor). A partir daí, a narrativa retrocede, revelando quem é Chuck: um contador na meia-idade, um jovem descobrindo a si mesmo e, por fim, uma criança em uma casa supostamente mal-assombrada. Essa estrutura engenhosa reforça a mensagem central do filme: cada vida, por mais comum que pareça, contém um universo inteiro de momentos que ecoam pela eternidade.
Um Elenco em Harmonia e a Surpresa Musical

Tom Hiddleston entrega uma performance carismática e vulnerável, afastando-se de seus papéis mais conhecidos para encarnar um homem comum cuja jornada ganha significado cósmico. O elenco de apoio é igualmente brilhante, com Chiwetel Ejiofor servindo como a âncora emocional da história e Karen Gillan e Mark Hamill em participações marcantes.
Um dos pontos altos do filme são suas inesperadas sequências musicais. Em cenas de dança contagiantes, Flanagan usa a música não como um artifício, mas como uma expressão pura da alegria e da liberação, criando momentos de beleza que contrastam com a melancolia da mortalidade.
A Fidelidade de Flanagan e a Voz de King
Consolidando sua reputação como um dos melhores adaptadores de Stephen King (após Doutor Sono e Jogo Perigoso), Mike Flanagan opta por uma fidelidade quase total ao conto original. Sua direção é sensível e focada na humanidade dos personagens. No entanto, essa reverência ao texto resulta no ponto mais fraco do filme: uma narração em off excessiva (feita por Nick Offerman) que, por vezes, soa redundante e diminui o impacto visual da obra.
Veredito
“A Vida de Chuck” é um filme belo, comovente e profundamente humano. É uma obra que celebra a vida em seus momentos mais simples e prova o alcance extraordinário de Stephen King como um contador de histórias sobre a condição humana. Embora sua abordagem literária possa testar a paciência de alguns, seu núcleo emocional e atuações memoráveis o tornam uma das experiências mais recompensadoras do ano no cinema e um nome que certamente ouviremos muito na temporada de premiações.