Como ‘And Just Like That…’ Desconstruiu o Charme de ‘Sex and the City’

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Com o anúncio do seu cancelamento pela HBO Max, “And Just Like That…” chega ao fim não com um brinde de Cosmopolitan, mas com um suspiro de alívio de muitos fãs. A aguardada continuação de “Sex and the City” prometia reviver a magia de um dos maiores fenômenos culturais da TV, mas ao longo de três temporadas, entregou uma crônica de descaracterização que levanta uma questão incômoda: um capítulo final sombrio pode apagar o brilho de uma história icônica?

A verdade é que “And Just Like That…” nasceu menos de uma necessidade criativa e mais de uma estratégia corporativa. Na acirrada guerra do streaming, a HBO precisava de um canhão para seu catálogo, e o nome “Sex and the City” era a munição perfeita. No entanto, ao ressuscitar a série por demanda de mercado, os produtores, talvez por arrogância, acreditaram que a fórmula dos anos 90 ainda funcionaria, criando um monstro de Frankenstein: um corpo com a aparência do clássico, mas sem sua alma.

O erro mais gritante e talvez imperdoável foi a traição às suas próprias protagonistas. A força da série original residia na complexidade de suas personagens, mas a continuação as reduziu a caricaturas de si mesmas:

  • Carrie Bradshaw, a cronista sagaz e ícone de independência, foi transformada em uma mulher hesitante e queixosa, cujas decisões orbitavam quase exclusivamente em torno dos homens de sua vida.
  • Miranda Hobbes, a advogada cínica e brilhante, a personificação da razão, regrediu a uma figura impulsiva, egoísta e, por vezes, cruel em suas escolhas.
  • Charlotte York, antes a defensora do ideal romântico com suas próprias neuroses, tornou-se um alívio cômico quase unidimensional.

Elas se tornaram irreconhecíveis, perdendo a essência que as tornou tão amadas e relacionáveis, mesmo em meio ao luxo de Manhattan.

A tentativa de modernizar o universo da série para as sensibilidades do século 21 foi igualmente desastrada. A inclusão de novos personagens para representar a diversidade de Nova York soou forçada e superficial. Em vez de serem integrados organicamente, Seema, Nya, Lisa e Che pareceram servir como acessórios para ensinar lições de progressismo ao trio principal, em tramas que soavam mais como um manual de conduta do que como histórias genuínas. O vazio deixado pela ausência de Samantha (Kim Cattrall) nunca foi verdadeiramente preenchido.

O fracasso da continuação só acentua a genialidade da série original. “Sex and the City” foi um fenômeno porque, sob a superfície de sapatos Manolo Blahnik e apartamentos de luxo, pulsava uma verdade universal: a amizade feminina como alicerce. Era um conto de fadas moderno onde o verdadeiro “felizes para sempre” era o brunch de domingo com as amigas, o espaço seguro para compartilhar vitórias, medos e desilusões.

Então, o legado foi arruinado? Provavelmente não. A força dos 94 episódios originais deve resistir a este epílogo decepcionante, assim como sobreviveu aos dois filmes questionáveis da franquia. Contudo, “And Just Like That…” ficará como um estudo de caso, uma lição amarga sobre como a nostalgia, quando explorada sem respeito e propósito, pode transformar ouro em pó, deixando para trás apenas a memória empoeirada do que um dia foi brilhante.

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