Produzir uma cinebiografia de Benito Mussolini em 2025 é, por si só, uma aposta arriscada. Fazer ‘Mussolini: O Filho do Século’ — uma minissérie estilizada, maníaca e que nos coloca diretamente na mente do ditador — é jogar perigoso. No entanto, a julgar por seus primeiros episódios, a produção que chega ao Brasil pela MUBI não apenas entende os riscos, como os utiliza para entregar uma obra historicamente precisa e moralmente impecável.
A Aposta Arriscada: O Fascismo Como Videoclipe
Baseada no premiado livro de Antonio Scurati, a série dirigida por Joe Wright (Orgulho & Preconceito) não é um drama histórico convencional. A narrativa condensa anos de história em um ritmo frenético, com uma estética que remete a um videoclipe de new wave: luzes piscantes, atuações operáticas e o próprio Mussolini quebrando a quarta parede para nos confessar suas manipulações.
O risco, evidente, é o de glamourizar a filosofia e o estilo de vida de um movimento violento. Ao nos colocar lado a lado com o ditador, a série caminha em uma linha tênue que poderia facilmente levar à simpatia por sua figura. Felizmente, ela nunca tropeça.
Um Roteiro que Expõe a Hipocrisia
O trunfo de O Filho do Século está em seu roteiro inteligente. Os roteiristas Stefano Bises e Davide Serino, trabalhando com o autor do livro, confiam na inteligência do espectador. Eles nos apresentam a retórica fascista vestida de rebeldia punk, mas simultaneamente expõem as hipocrisias e as trapaças por trás do discurso. A série não inventa desculpas para seu protagonista; ela simplesmente lhe dá a palavra e permite que ele se enforque com suas próprias contradições.
A Direção que Subverte a Própria Estética
É na direção de Joe Wright que a genialidade do projeto se consolida. Ele e seu diretor de fotografia, Seamus McGarvey, sequestram a linguagem do cinema de terror — com ângulos de câmera tortos e um jogo constante de luz e sombra — para subverter o glamour que eles mesmos criam. Enquanto o discurso de Mussolini é sedutor, a imagem nos diz que há algo de podre e grotesco ali. A estética de videoclipe, então, não serve para glorificar, mas para emular a distorção ideológica do fascismo.
Veredito
‘Mussolini: O Filho do Século’ é uma obra desafiadora e formalmente audaciosa. É uma minissérie que exige um espectador atento, mas que recompensa com uma aula de história ágil, precisa e visualmente fascinante. Ao acertar em todos os pontos em que seria mais fácil errar, a produção se firma como uma das mais importantes e corajosas do ano, provando que é possível explorar a mente do monstro sem jamais absolvê-lo.